Honestos, desonestos ou ingênuos, todos nós assistimos estarrecidos aos vídeos das delações dos donos e executivos da Odebrecht à Operação Lava-Jato. Chocantes de tão deslavadas, institucionalizadas e sistêmicas.

As negações protocolares soam vazias, são meias respostas evasivas que nada justificam e acabam por chafurdar uma geração inteira de políticos de todos os espectros, de esquerda, centro ou direita.

Mas, a não ser que aconteça o pior – um acordo salvador para interromper que se puxe o fio de meada –, a delação da Odebrecht vai enredar uma série de políticos, cada um a seu tempo, e emendar-se por meio de consórcios e cartéis em investigações sobre outras empresas e outros setores de concessão numa teia sem fim.

Isso significa que, por muito tempo, provavelmente anos, ainda teremos notícias de empresas que utilizaram caixa dois para comprar favores de políticos e desviar dinheiro que poderia estar fazendo frente aos graves problemas sociais do país. Mesmo que muitos desses crimes acabem por prescrever, é bom frisar que prescrição não é sinônimo de absolvição.

E isso afeta a todas as empresas, não somente as envolvidas. Pesquisa realizada no ano passado pela consultoria internacional GlobeScan mostra que o nível de confiança da população dos grandes centros urbanos brasileiros nas empresas é um dos mais baixos do mundo, e afeta companhias nacionais e multinacionais.

Se o nível de confiança das pessoas nas empresas já era baixo antes dessa enxurrada de vídeos de homens engravatados contando com tranquilidade como compravam todas as esferas de poder (municipal, estadual e federal), o que dirá após esse show explícito de sacanagem?

Por muitos anos, imperou no imaginário popular a ideia de que o empresário é um explorador. Desde a virada do século, com a noção de responsabilidade social corporativa (RSC), ganhou espaço a percepção de que a boa empresa era aquela que respeitava os interesses de seus públicos de relacionamento – funcionários, comunidades próximas, clientes, fornecedores etc.

Soma-se a essa mudança de comportamento empresarial o fato de que as empresas, em muitos casos, tornaram-se mais fortes do que a estrutura da administração pública local e, portanto, passaram a prover soluções que o Estado já não conseguia oferecer. Com tudo isso, o respeito pelas empresas cresceu. Mas os constantes escândalos, sobretudo éticos, no Brasil e no mundo, voltaram a derrubar a reputação das corporações nesta década.

Por aqui, no entanto, nada se compara ao que nos foi explicitado pelas delações da Odebrecht. E isso afeta a credibilidade de todas as empresas, sobretudo, as maiores. É preciso rastrear e rever como advogam suas causas, individuais ou setoriais. É necessário construir sistemas de integridade que não sejam de fachada. É importante repensar como encaram a obrigatoriedade legal, que deve ser o nível mínimo de atuação a partir do qual expandem suas iniciativas – e não a justificativa para seus atos.

E, claro, como comunicam-se com a sociedade de uma forma crível e empática. O atual modelo mental de políticos e empresas não está funcionando. Negar, como marido infiel, o inegável. Alegar que tudo foi feito dentro da lei vigente. Dizer que esteve na reunião, mas nunca discutiu valores. São todas formas protocolares que nada justificam, que não deslocam o suspeito para um outro patamar, ao contrário, o mantém no mesmo lodaçal que os demais.

Transparência radical, humildade de aprendiz ou arrependimento genuíno seriam ótimos ingredientes para reconstruir e reforçar a credibilidade do mundo empresarial. Sabemos, no entanto, que essas posturas não condizem com a forma de pensar de 99% dos empresários e executivos brasileiros.