Em dezembro de 2016, após fechar acordo de R$ 3,1 bilhões com a Justiça dos EUA, da Suíça e do Brasil, a petroquímica Braskem considerava ter encerrado o “capítulo Lava Jato” em sua história. Porém, a divulgação dos vídeos das delações recolocou seu nome nas manchetes. A Braskem – gigante que fatura R$ 54 bilhões ao ano e tem Odebrecht e Petrobras como sócias – alega que os fatos das últimas semanas estão inclusos no acordo homologado pelo DoJ americano e pelo Ministério Público brasileiro, mas que ainda precisam do “carimbo” do juiz Sérgio Moro.

Nesta entrevista, o executivo Fernando Musa, que assumiu o comando da petroquímica há um ano, afirma que a corrupção na Braskem era concentrada – diferentemente do que ocorria em sua principal acionista, a Odebrecht. “No caso da Odebrecht, fala-se de um processo sistêmico e endêmico; na Braskem, não tem essas frases na avaliação do DoJ. É algo mais concentrado, pontual, embora relevante e grave”, afirmou Musa. Leia os principais trechos da entrevista:

Qual é o risco de novos fatos sobre a Braskem aparecerem nas investigações da Lava Jato?

Tudo o que está vindo à tona agora é um substrato do que levou ao nosso acordo (com a Justiça dos EUA, da Suíça e do Brasil). A expectativa é que não tenha nenhum fato novo ou relevante. Agora aparecem coisas como o Emílio Odebrecht falando em mudar a sede da Braskem do México para os Estados Unidos – o que tivemos de desmentir porque sequer foi discutido. Com relação à Lava Jato, o acordo já cobre tudo (os ilícitos cometidos pela Braskem). No México também houve notícias sobre pagamento de propina pela Braskem, quando, na verdade, o caso envolveu a Odebrecht.

O fato de a Justiça brasileira ainda não ter homologado o acordo feito com o DoJ e o MP atrapalha a Braskem?

Do ponto de vista prático, não. A multa está determinada, assim como as obrigações da empresa. Na prática, a homologação pelo juiz Sérgio Moro poderá apenas fazer com que a Braskem possa ser chamada a prestar esclarecimentos em outros processos.

A Braskem terá monitores em sua operação, dentro do acordo que já firmou com o DoJ. Como está este trabalho?

O acordo com o DoJ (Departamento de Justiça dos EUA) prevê uma permanência de três anos, mas o trabalho pode ser interrompido com antecedência. Os monitores já foram designados e, cerca de 15 dias atrás, participaram de uma série de reuniões na Braskem. Trata-se de um processo rígido, com prazos claros. Agora, eles precisam conhecer o acordo de leniência, para criar um plano de trabalho, que será aprovado por DoJ e MP – o que deverá ocorrer em maio. Depois disso, virão as reuniões de monitoramento, voltadas para o futuro, a melhoria dos processos e da governança.

Só mudar a presidência basta para dizer que a Braskem é uma empresa livre de corrupção?

As situações da Braskem e da Odebrecht são muito diferentes. Na Braskem, a corrupção era concentrada na liderança. No caso da Odebrecht, fala-se de um processo sistêmico e endêmico; na Braskem, não tem essas frases na avaliação do DoJ. É algo mais concentrado, pontual, embora relevante e grave. São 77 delatores (da Odebrecht), enquanto sete mencionam a Braskem, sendo que alguns nem trabalhavam diretamente na companhia. Diretamente, são três: os ex-presidentes Alexandrino Alencar e Carlos Fadigas, além do ex-diretor financeiro Paul Altit.

Mesmo após a Lava Jato ser deflagrada, os partidos continuaram pedindo propina. Se isso ocorrer agora, qual será o procedimento da Braskem?

Precisa-se tomar certo cuidado de não criar problema jurídico, porque tem de provar depois (que foi feito um pedido ilícito). Mas não se aceitará pedidos de propina, estamos deixando isso publicamente claro. Se alguém pedir, claro que não vai receber.

Com as consequências da Lava Jato, a Braskem virou o principal ativo, a ‘joia da coroa’, da Odebrecht. Tanto o grupo quanto a Petrobras deverão vender suas fatias na Braskem?

A Petrobras já deixou público que pretende vender sua fatia. Está no plano estratégico da companhia, é algo resolvido. A Odebrecht tem deixado claro que não pretende vender as suas ações na Braskem. Se isso mudar, a empresa toda estará à venda. Uma coisa é vender 36% (a participação atual da Petrobras), outra é vender 75% (fatia combinada da Petrobras e da Odebrecht).

Diante das dificuldades da Odebrecht, que cogita até pedir recuperação judicial, qual é a lógica de não vender a Braskem?

É um negócio que vai muito bem, mas está subvalorizado. As ações subiram muito, mas ainda estão muito longe do patamar de empresas com portfólio semelhante. Acabamos de iniciar um projeto de R$ 5,2 bilhões no México e agora é que vamos começar a ganhar com ele. Tem muito valor a ser capturado no futuro e uma venda agora poderia significar perder dinheiro.

Essa subvalorização das ações tem relação com a Lava Jato?

Tem um pouco de tudo. O principal elemento é a incompreensão do mercado de que a Braskem não é uma empresa brasileira. Hoje, 50% da receita vem de fora do Brasil. Essa noção de que somos uma empresa brasileira nos impede, por exemplo, de ter o grau de investimento da Moody’s, por exemplo. Claro que toda a questão da Lava Jato, essa confusão agora com a delação do Emílio Odebrecht, não ajuda. E o fato de termos dois acionistas enfraquecidos e com desafios – a Odebrecht e a Petrobras – também atrapalha. Então, não dá para dizer que a Lava Jato não contribui, mas não é o fator determinante.

A Braskem vem investindo cada vez mais fora do País. Há alguma chance de novos projetos no Brasil?

No curto e médio prazos, a proporção do Brasil (na receita) tende a diminuir. Para aumentarmos capacidade de produção, precisamos de demanda local. Lá fora tem demanda e também matéria-prima competitiva, com contratos longos, de até 20 anos. Aqui, a nafta é negociada com a Petrobras a cada cinco anos. A Braskem, nos próximos cinco ou dez anos, vai investir fora do Brasil. Por aqui, os investimentos serão incrementais, mas sem um salto relevante. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.