Na sala-cofre do 3º andar do Supremo Tribunal Federal (STF), 10 caixas foram depositadas na terça-feira 14 como se fossem bombas capazes de abalar a política nacional. No mesmo pavimento, fica a sala da presidente da mais alta instância do Poder Judiciário, a ministra Cármen Lúcia. Mas o conteúdo, que chegou ao edifício projetado por Oscar Niemayer às 17 horas, em dois carros do Ministério Público Federal, tinha outro destinatário: o ministro Edson Fachin, relator da Operação Lava Jato.

Ele irá analisar os 320 pedidos, com 83 aberturas de inquéritos, do Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot. Neles, há indícios de crimes como corrupção passiva, lavagem de dinheiro, formação de cartel com fraude à licitação e pagamentos não contabilizados, conhecidos como caixa dois. Todos foram feitos com base nos 950 depoimentos de 78 delatores ligados à Odebrecht. Até a última sexta-feira, os documentos estavam em fase de processamento, sendo cadastrados e digitalizados no sistema do STF. Nesta semana, eles serão entregues para Fachin, que decidirá se quebra o sigilo dos nomes do que vêm sendo chamado de “a lista de Janot”. E seu impacto, antes mesmo da detonação, já é explosivo.

DIN1001-janot2O Procurador-Geral defende a transparência em razão do interesse público. Os nomes que vêm sendo divulgados até aqui têm como base a lista dos pagamentos feitos pela Odebrecht, que definiu um apelido para cada um dos políticos beneficiados pelo repasse de dinheiro. Por isso, aparecem entre os possíveis presentes na lista de Janot os ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff; seis ministros do governo Michel Temer, como Eliseu Padilha, Wellington Moreira Franco, Gilberto Kassab, Marcos Pereira, Bruno Araújo e Aloysio Nunes; governadores como Geraldo Alckmin, Luiz Fernando Pezão e Fernando Pimentel; e parlamentares como Renan Calheiros, Lindbergh Farias, Aécio Neves, José Serra, além dos presidentes da Câmara e do Senado, Rodrigo Maia e Eunício Oliveira, respectivamente.

Todos negam irregularidades nas campanhas. Ao todo, são 170 pessoas com foro privilegiado e 211 que serão julgadas por outras instâncias. Há, também, sete pedidos de arquivamento e 19 de autorização para coleta de provas. Entre as dezenas de respostas padrão, como “as doações foram feitas dentro da lei”, poucos políticos deixaram clara sua opinião sobre a tensão que paira sobre a política nacional. “A lista do Janot não atrapalha os trabalhos da Câmara”, disse Rodrigo Maia. “O mais importante é que as instituições estão funcionando, que o Ministério Público e o Ministério da Justiça continuem avançando nas investigações, que são muito importantes, e que o Congresso continue aprovando, votando as reformas que o Brasil tanto precisa para superar a crise.”

O principal receio é, justamente, a lista de Janot cair como uma bomba no Congresso Nacional e provocar uma paralisia na aprovação de medidas essenciais para a recuperação da economia. O risco é que as principais reformas, como a da Previdência, sejam adiadas em razão do grande tumulto envolvendo centenas de parlamentares sob investigação. O Planalto, que trabalhava com a primeira votação na primeira quinzena de abril, já tem como expectativa o mês de maio. Sem a reformulação das regras da aposentadoria, as pequenas conquistas alcançadas até agora, como a queda da taxa Selic, a inflação convergindo para o centro da meta e um alívio no mercado de trabalho, depois de quase dois anos de demissões (leia mais aqui), podem retroceder.

Para mexer ainda mais com a expectativa da classe política, o ministro Gilmar Mendes, presidente do Tribunal Superior Eleitoral, incendiou Brasília quatro dias antes de Rodrigo Janot entregar a documentação no STF. Mendes afirmou que nem toda doação via caixa dois deve ser considerada ilegal. A exceção acontece justamente quando a empresa doadora recebe um benefício público. “Corrupção pressupõe um ato de ofício, que é ato de competência do funcionário público, então alguém pode fazer a doação sem ser corrupção”, disse ele. “O normal dos candidatos é pedir doação, não pedir doação por caixa dois. Porque a princípio não há nenhum ônus para o candidato ter a doação no caixa um, não paga tributo, não tem nada.” É de se supor que crimes de lavagem de dinheiro ficam de fora. Mas não há dúvida que uma parte dos políticos recebeu essa frase de Gilmar Mendes com esperança.