Algo se materializou nesse 8 de março, Dia Internacional da Mulher. Foi mais que um incômodo, uma sensação de enfadonha repetição. Foi um grande e sonoro: BASTA!

Com uma intensidade totalmente diferente dos anos anteriores, o que ouvi nesse 8 de março foi um basta contra a hipocrisia. Basta de encobrir a questão da igualdade de gênero com homenagens em um dia do calendário, basta de não encarar um modelo mental que coloca as mulheres em segundo plano em todos os campos de decisão de nossa sociedade. Basta para um tratamento desigual, desrespeitoso e, incontáveis vezes, agressivo.

Nesse 8 de março, mulheres de todas as idades não estavam muito receptivas a flores e mensagens fofinhas. Queriam encarar a discussão. Como a imagem da estátua da menina desafiante que foi colocada em frente ao famoso touro de Wall Street, em Nova York.

É preciso encarar de frente dados alarmantes: 503 mulheres acima de 16 anos foram agredidas por hora em 2016 no Brasil, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. No recém terminado Carnaval, os índices de violência às mulheres são assustadores e generalizados no país.

No mundo do trabalho, as diferenças de remuneração entre homens e mulheres para mesma função persistem e a ascensão a cargos de liderança continua sendo esporádico. Profissionais de gestão de pessoas mais atentos já perceberam que esse passou a ser uma questão crítica e urgente para o futuro das empresas.

As barreiras são tão evidentes que a diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Christine Lagarde, defendeu a criação de cotas de gênero para apoiar a inclusão feminina no mercado de trabalho.

Esse é um tema polêmico, que esbarra no amor-próprio das mulheres, especialmente as escolarizadas, que muito justamente querem derrubar as resistências pelo próprio talento. Mas Lagarde justificou: “Costumava pensar que era ofensivo contar com cotas de gênero. Até que olhei para a evolução demográfica e percebi que não avançava suficientemente rápido. Por isso, sou a favor das cotas”.

Lagarde foi direto ao ponto. É preciso de uma ação afirmativa para romper o domínio que está nas mãos de homens brancos graduados com mais de 40 anos e que tendem a reproduzir o modelo vigente, no qual formaram seus próprios conceitos. Do contrário, as barreiras não cairão.

Talvez um outro exemplo de Wall Street possa inspirar as mulheres no mundo do trabalho: “ocupar e resistir”, pregava o emblemático movimento Occupy Wall Street em 2011. Ele foi a ponta de lança de um espírito desafiador contra travas de nossa sociedade, que a cada dia são mais e mais questionadas.

Quando sugeriu as cotas do alto dos seus 61 anos, Christine Lagarde deu voz à menina em bronze com olhar destemido de Wall Street.