O Brasil retrocedeu em políticas de direitos humanos em 2016, concluiu o relatório anual da Anistia Internacional divulgado nesta terça-feira, 21. Para a entidade, a crise política nacional impactou diretamente o setor no País e deixou “um sinal de alerta do que está por vir”. Segundo a Anistia, houve falência das políticas de segurança pública, aumento da violência no campo e retrocessos a direitos fundamentais já conquistados.

“O ano de 2016 não foi fácil. Vimos muitas violações aos direitos humanos, como o desmantelamento de estruturas institucionais e de programas que garantiam a proteção a direitos previamente conquistados”, disse a diretora da Anistia Internacional no Brasil, Jurema Werneck. “As autoridades também se omitiram em relação a temas críticos, como a segurança pública.”

Entre os exemplos de ações que ainda vão impactar os direitos humanos apontados pela entidade, está a Emenda Constitucional 95 (ex-PEC 55), que limita os gastos do governo federal. A medida foi apresentada pelo presidente Michel Temer como uma proposta para reequilibrar as contas públicas e recuperar a economia brasileira e congela as despesas federais por 20 anos.

“A PEC pode ter efeitos negativos nos investimentos na saúde e na educação do País. Nenhuma crise, política econômica ou institucional, pode ser usada como justificativa para a perda de direitos”, disse Jurema.

A entidade apresentou números que, segundo afirma, comprovam o retrocesso da área de direitos humanos no País. Um deles é a estatística de 60 mil homicídios registrados no Brasil em 2016, contra 58 mil em 2015. “Mais de 70% das vítimas morreram atingidas por arma de fogo. A maioria das vítimas é masculina, jovem e negra”, informou o relatório.

O documento destacou o alto número de homicídios cometidos pela polícia em serviço. Segundo o relatório, no Estado do Rio, 800 pessoas foram mortas por policiais em 2016. Só 8% desses casos foram investigados.

“Não investigar o caso é uma segunda forma de violência contra a família da vítima. Isso se tornou uma regra. Ao mesmo tempo, a população carcerária aumentou, e a maioria dos presos cometeu crimes não-violentos. Isso mostra que há uma prioridade do Estado, por exemplo, no combate ao tráfico de drogas”, disse a assessora de Direitos Humanos da anistia, Renata Neder.

A entidade também citou a violência no campo – pelo menos 47 defensores de direitos humanos no campo e lideranças rurais foram mortos de janeiro a setembro de 2016 em decorrência de conflitos por terra e recursos naturais.

O relatório também criticou as autoridades e organizadores da Olimpíada do Rio. Segundo a entidade, não foram implantadas medidas necessárias para evitar violações aos direitos humanos pelas forças de seguranças antes e depois do evento esportivo.

“O número de pessoas mortas pela polícia na cidade do Rio, imediatamente antes dos Jogos, entre abril e junho, aumentou 103%, em relação ao mesmo período de 2013”, analisou a entidade no texto.

“Os moradores de favelas relataram horas de tiroteios intensos e abusos contra os direitos humanos, como buscas domiciliares ilegais, ameaças e agressões físicas. A Polícia admitiu ter matado 12 pessoas durante os Jogos e ter se envolvido em 217 tiroteios em operações.”

O relatório também criticou a extinção, em maio, do Ministério das Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos e a sua redução a uma secretaria. A iniciativa, tomada quando o presidente Michel Temer tomou posse provisoriamente do cargo, no primeiro semestre, causou, segundo a Anistia, redução significativa de recursos e programas dedicados a salvaguardar os direitos as mulheres.

“Uma série de estudos durante o ano mostrou que a violência letal contra as mulheres aumentou 24% durante a década anterior e confirmou que o Brasil é um dos piores países da América Latina para se nascer menina”, afirmou a Anistia no relatório.