O primeiro fim de semana de julho parou a cidade de Santiago. No domingo, dia 2, fazer um percurso tranquilo de três quilômetros e meio, que liga um dos maiores centros comerciais da América Latina, o Costanera, a um dos pontos turísticos badalados do capital andina, o Patio Bella Vista, passou a durar o dobro do tempo. Buzinas e bandeiras do país estavam espalhadas por todos os cantos. Todos atentos e vidrados na televisão e no noticiário. Engana-se, porém, quem acreditou que a motivação para tanta euforia fossem as primárias presidenciais, que guiaria os rumos das eleições de novembro.

Exatamente no mesmo dia, o Chile enfrentou a Alemanha na final da Copa das Confederações. Assim como a derrota no campeonato de futebol, que deu o título aos europeus por 1 a 0, para os chilenos o país também tem perdido com os rumos da política. Enfraquecida, a coalizão Nova Maioria, da atual líder Michelle Bachelet, não organizou prévias. A Constituição impede que a presidente se candidate a uma terceira reeleição e os partidos que integram a chapa de centro-esquerda discordam sobre quem será o seu representante.

Enquanto isso, o principal oponente de sua coalizão, o ex-presidente Sebastián Piñera, da chapa de direita Vamos Chile, disputou as prévias da chapa. Ele obteve ampla maioria com 57,4% dos votos e se fortaleceu para a disputa do fim do ano. Desiludidos com a esquerda e pouco esperançosos com os avanços da direita, a sensação é a de que a nação terá mais do mesmo nos próximos quatro anos. Os sentimentos de insatisfação e de desilusão são representados em números de pesquisas.

Nos primeiros dez dias de julho, o instituto de opinião pública Cadem divulgou um relatório sobre como a população reagiu com o resultado das primárias e o que ela espera para o futuro. E o resultado não foi nada animador. Quando indagados sobre como os eleitores avaliam o caminho econômico do Chile, independentemente do governo, 66% disseram que a economia não será bem conduzida. Sobre o progresso econômico, 86% acreditam que o país retrocederá e 62% classificam a situação do emprego com “mau ou ruim” (a taxa de desemprego lá não passa de 7%).

Insatisfação: representantes estudantis protestam contra os rumos da reforma na educação, proposta pelo governo de Michelle Bachelet (Crédito:Martin Bernetti | AFP Photo)

Para o economista chileno e presidente da Comissão Nacional de Produtividade, Joseph Ramos, o sentimento negativo da população pode ser explicado pelo rápido progresso que o país teve nos últimos 20 anos e a falta de preparo para que ele acontecesse da melhor maneira. “A tese é que a insatisfação não é com o modelo de política chilena, mas com a a falta de modernização da economia”, diz Ramos. Embora esteja descolado de problemas regionais mais graves que enfraqueceram economias da região, como a venezuelana e a brasileira, o Chile também foi impactado pelo término do boom das commodities.

Mesmo mantendo o crescimento desde 2013, o ritmo passou a desacelerar e o PIB, que atingiu os 4% de avanço naquele ano, não passou da média de 2% nos três anos seguintes, totalizando US$ 247 bilhões.  A projeção para 2017 é de 1,8% de crescimento. Assim como os vizinhos, a economia é regida, em sua maioria, por commodities. Lá, o cobre é o principal componente da balança comercial, sendo o principal produto exportado, seguido de minério de cobre, sulfato de celulose química e cobre bruto. Até 2013, a média anual do preço do cobre era de US$ 7.332 a tonelada.

Atualmente, o valor não atinge os US$ 6.000 (confira quadro ao final da reportagem). A apatia econômica foi somada à descrença com a atual presidente Michelle Bachelet. Desde agosto de 2016, a líder passou a ser questionada com a revelação de que seu filho e sua nora estiveram envolvidos em casos de fraude e de sonegação fiscal. Desde então, a presidente socialista viu seu índice de aprovação cair para o menor patamar desde a retomada da democracia com o fim da ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990). Uma pesquisa do Centro de Estudos Públicos apontou que a aprovação da presidente atingiu apenas 15%, enquanto sua reprovação registra 66%. Atualmente, Bachelet enfrenta manifestações contrárias às reformas propostas pelo seu governo, como a da educação, a da previdência e a tributária.

Assim como em outros países do continente, entre eles Peru, Argentina, México e, indiretamente, Brasil, a tendência é que o país passe a caminhar para a direita. Consagrado vencedor nas eleições municipais, o líder da chapa de direita Vamos Chile, Sebastián Piñera, pode conquistar a presidência nas eleições que acontecem em novembro. Empresário e economista, Piñera foi presidente do país entre 2010 e 2014, deixando o posto para a Bachelet. Embora não represente a mudança que os chilenos esperam, nas últimas pesquisas, o político aparece em primeiro lugar com 30% de intenção dos votos. Para tentar conter o candidato, candidatos da centro-esquerda estudam uma coalizão.

Ela seria formada pelo senador Alejandro Guillier, que obtém 13% das intenções de voto, com a senadora democrata cristã Carolina Goic. Atrás de Guillier, está a representante de uma esquerda mais radical, a jornalista Beatriz Sánchez, com 5% de intenção de voto. Priorizando o avanço econômico, a tendência é que a população busque por um líder que seja pró-mercado. “A vitória de Piñera seria bem recebida pelo mercado, o que elevaria a confiança dos empresários”, diz Patrícia Krause, economista-chefe da seguradora de crédito Coface para a América Latina. “Bachelet está em um terreno pessimista. O reflexo disso foram as baixas taxas de crescimento dos últimos anos”